Primavera 59 - ENRICA PLEBANI
Se há vidas que decorrem como um longo rio tranquilo, outras têm um percurso surpreendente.
ENRICA PLEBANI nasce nos arredores de Milão, a 8 de abril de 1960.
Herdeira das correntes contestatárias de maio de 68, apesar da sua educação religiosa e a contragosto dos pais, afasta-se da fé. Manifesta-se abertamente contra a Igreja e rejeita qualquer forma de religiosidade. As discussões em casa são acaloradas. Seus pais não se conformam com esta filha rebelde.
Enrica revela-se exuberante, extrovertida e sociável. Obtém o diploma de educadora infantil. Porém, como as creches são ainda escassas nessa altura, não chega a exercer a profissão. Terá de se contentar com outro ganha-pão.
Entretanto, seu pai adoece. É aqui que tudo começa a mudar para Enrica.
Contrariando o expectável, deixa o emprego para assistir o pai. Afinal, apesar das desavenças geracionais, os laços familiares revelam-se ser mais importantes para ela do que a carreira e o salário. O que aconteceu nas longas vigílias à cabeceira do pai enfermo? Que conversas tiveram? Desconhecemos. O que sabemos é que, ao receber os últimos sacramentos, o pai oferece a sua vida e seus sofrimentos pela conversão da sua filha rebelde.
Os últimos momentos do pai, sereno e consciente, impressionam tanto Enrica que esta sente a necessidade urgente de se confessar ao sacerdote que assistiu seu pai. No quarto contíguo, na mesma noite da morte do pai, confessa-se, dando novo ordem à sua vida e seus valores. Sai transformada. Sente e sabe que Jesus voltou a entrar na sua vida, renovando-a com a sua força.
Ela sente-se agora muito amada porque muito perdoada. Faz então todo o possível para recuperar o tempo perdido: a eucaristia torna-se o centro do seu dia. Participa nela diariamente. Encontra na oração força e inspiração para seu quotidiano. Busca agora fortes experiências de espiritualidade. Encanta-se com os Missionários da Imaculada Conceição do P. Maximiliano Kolbe.
Tudo na sua vida muda. Em primeiro ligar, os relacionamentos humanos, agora vividos na doçura e sensibilidade: torna-se afetuosa com os familiares, serena e descontraída com os colegas de trabalho, extremadamente atenciosa com os amigos aos quais tenta fazer compreender quanto belo é recuperar a fé que dá sentido à existência.
A mãe, desconcertada com tal drástica mudança, é a primeira a sentir-se atordoada com a transformação de Enrica. Esta, procura entretanto uma forma de aliar a sua fé recém-adquirida a atitudes, gestos e opções de caridade autêntica a favor de idosos, doentes, crianças e pessoas com deficiência.
É o encontro com Ettore Boschini, religioso camiliano que se dedica ao sem-abrigo e excluídos em Milão, que lhe proporcionará uma orientação precisa ao seu desejo de caridade. Entre os dois estabelece-se uma extraordinária afinidade espiritual e um aprofunda partilha de ideias. De tal maneira que Ettore vê em Enrica a futura responsável da comunidade feminina que espera fundar. Também ela deseja entregar-se mais inteiramente a Deus. Tenta conciliar o amadurecimento da sua fé com o trabalho, seu lugar na família e os cansativos turnos de assistência ao sem-abrigo. Por isso, pede e espera um sinal claro de Deus.
O sinal chega, mas não de acordo com as expectativas. Primeiro, sob a forma de uma febre persistente. De seguida, são dores nas articulações que a impedem de andar. Após a suspeita de uma doença infeciosa, por fim, é diagnosticado um linfossarcoma gástrico.
Enrica consome-se em poucos meses. Vive sua dor em plena adesão à vontade de Deus. Distribui serenidade ao seu redor. Tenta viver, na medida do possível, a caridade. Por fim, morre em Aviano em 27 de fevereiro de 1990.
Na Sociedade do Irmão Ettore, ainda permanece viva a memória desta ex-rebelde, que se converteu em serva e amiga dos sem-abrigo por amor de Jesus.
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